Um misto de desprezo,
tristeza, frustração, decepção... incompreensão. Não conseguia entender o
porquê daquilo. Não encontrava respostas à pergunta que ecoava em sua cabeça:
“como chegamos a esse ponto?”.
Sentia raiva. Uma
raiva por ser uma espectadora qualquer diante da situação. Poderia parecer um
mero comentário. Desses que a gente costuma ver por aí, nessa internet tão
vasta, que, apesar de abrigar coisas úteis, muitas vezes é palco de cenas pejorativas
ou nada construtivas.
Mas aquele comentário
chamou a atenção de Natália. Enlaçou-a numa angústia sem fim na tarde daquela terça-feira,
quando ela havia acabado seus afazeres, e resolvera acomodar-se em sua cadeira
e tomar um café com pão. Apenas jogar o tempo fora vendo vídeos na internet.
Caro leitor,
Peço que eventual
impacto não lhe cause transtornos, mas, este era o comentário que se
apresentava diante de Natália e seria motivo para grande inquietação de seu
coração: “10 likes and I kill myself”.
Um pouco forte, não? Mas exatamente assim,
sem tirar, nem acrescer. Espero que lhe seja compreensível de alguma forma, por
isso pouparei traduções, caro leitor e amigo. Porém, o que Natália reparou logo
após foi o que conseguiu espremer cada espaço dentro dela, e causar-lhe uma
enorme repulsa.
81 curtidas. 16
minutos. Pasmem... ou não.
Ela parou, olhou.
Pensou sobre aquilo por um instante. Natália não sabia por que aquele
comentário teria sido feito. Ela pensou sobre muitos outros que são apenas
comentários vazios por aí, com o intuito de apenas chamar atenção na internet. Porém,
não sabia ela se a pessoa que o fizera estaria passando por algo dentro de si e
precisava de algo assim como um gatilho. Ela esperava que não.
O que Natália sabia
era o peso que cada “like” daquele
tinha. Mais do que se perguntar o motivo de tal comentário, ecoava aquela mesma
pergunta: “como chegamos a esse ponto?”. O que move as pessoas a fazerem o que
a pessoa propunha, sem quaisquer dificuldades? A fim de quê, afinal? O que lhes
despertou o apetite de apertar aquele botão?
Natália queria
gritar. Queria sair correndo para um mundo onde aquilo jamais seria verdade.
Poderia parecer algo qualquer. Mas ela sabia que aquilo representava as
diversas “pequenas e insignificantes coisas”, porém grandiosas em seus sólidos
e pesados efeitos. Que acontecem todos os dias e somente passam... sem que
ninguém ao redor sequer perceba, e recaem sobre um só corpo. Em um só coração,
em uma só mente. E implodem. E devastam.
Palavras. Ou ações
que simplesmente as dispensam e bastam por si.
Partículas tais como
um gás... Sim, um gás. Perdoe-me pela pobre analogia, caro leitor. Falta-me
sabedoria para tal. Mas embarque nessa comigo. Invisível, silencioso e inodoro.
Isento de culpa, até então. E vai penetrando nos seus ouvidos ou transpassa seus
olhos... então caminha lentamente por seu corpo... de imediato, você sente uma
ardência. Um mal estar. Algo dentro de você não vai bem. Então, ele vai deixando
migalhas pelo caminho. E desintegra cada pequenino espaço.
Mas ele é tão inofensivo,
todos dizem. Não é nada demais, insistem; até provarem de seus efeitos. Somente
você conhece os rastros. Cada caminho que ele percorreu. E ficou lá, e então deixou
algo que nunca mais pôde sair.
Natália sabia da
fragilidade do ser humano. Sua inclinação para, muitas vezes, expressar o que
vem a sua mente. Sem pensar em suas eventuais consequências ou impactos.
Quantas vezes ela se
sentira pequena e vulnerável. Sabia que a dor que sentia sozinha, nem
sempre se reduzia com um gesto afável. Nem sempre era afável. Nem sempre alguém
lhe estendia a mão. Mas também sabia o quanto importava que, ao
menos, ninguém estendesse o pé meramente para empurrar-lhe quando estivesse na
beira de um precipício, preste a cair.
Natália sabia que
cada qual tem o seu precipício. Às vezes, ele pode ser alto, mas tão alto...
que em uma queda, tudo se esvai... muitas vezes sem se perceber, e entram irreversivelmente
para os números e para as insignificâncias das estatísticas... ou sequer
entram. Ela tinha em seu coração que não era “qualquer coisinha”. Era sobre
empatia. Era sobre humanidade.
Natália murchou como
uma uvinha passa. Não conseguia entender. E, se tentasse, sentiria ainda mais
raiva. Sua esperança estremecia. Sua impotência fazia-lhe pequenininha... E sua culpa, pois ela
também fazia parte daquilo, aumentava ainda mais.
...
Resolveu verificar,
então, as respostas àquele comentário. Surpreendeu-se com algumas mensagens,
aquelas afáveis. Sua esperança reacendeu em algumas faíscas. Pensou que,
talvez, nem tudo estivesse perdido, afinal. E que, talvez, tais palavras
pudessem fazer a diferença. E desejou que sim.
Porém, ainda se
sentia triste. O vazio permanecia. E aquele ocorrido ainda esmorecia-lhe
naquela tarde de terça-feira.
Não sabia ela sobre o
interior de cada um naquele exato momento. Não sabia se ainda restaria, para
algumas pessoas, um ombro para se recostar. Um colo ou um abraço. Ou qualquer
um daqueles gestos afáveis. Que as confortaria ou lhes daria suporte para,
simplesmente, permanecer em silêncio e aquietar-se por um momento.
Afinal, como diria
Marcelo Jeneci, “quantas são as dores e
alegrias de uma vida”... ou, nas palavras de Caetano Veloso, “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que
é”...
“Onde fomos parar?”,
pensava ela. “Por que apontar as armas uns para os outros?”. Natália nunca
saberia explicar. E ficaria corroída para sempre pelo inconformismo e decepção.
Por cada detalhe que se expressa todos os dias, a todo momento. Mesmo sem se
ver... mas nunca sem se sentir.
Ela desejava que
aquela pessoa estivesse bem.
Ela desejava que cada
pequeno, porém vasto mundo que abriga cada um, pudesse sobreviver às suas
tribulações diárias. E desejava que fôssemos melhores. Para si, para o mundo.
Uma utopia, talvez? Talvez, a esse ponto, fosse.
Mas o que Natália
nunca abandonaria seria sua esperança. Ela sabia da chama que poderia
ser acesa em cada um... e era tarefa tão simples... Contudo, seria o suficiente para
aquecer muitos corações.
Mariana Ribeiro, 3º ano C
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